sábado, dezembro 06, 2008

viver sempre também cansa


"Viver sempre também cansa.
O sol é sempre o mesmo e o céu azul
ora é azul, nitidamente azul,
ora é cinzento, negro, quase verde...
Mas nunca tem a cor inesperada.

O mundo não se modifica.
As árvores dão flores,
folhas, frutos e pássaros
como máquinas verdes.

As paisagens também não se transformam.
Não cai neve vermelha,
não há flores que voem,
a lua não tem olhos
e ninguém vai pintar olhos à lua.

Tudo é igual, mecânico e exacto.

Ainda por cima os homens são homens.
Soluçam, bebem, riem e digerem
sem imaginação.

E há bairros miseráveis sempre os mesmos,
discursos de Mussolini
guerras, orgulhos em transe,
automóveis de corrida...

E obrigam-me a viver até à Morte!

Pois não era mais humano
morrer por um bocadinho,
de vez em quando,
e recomeçar depois,
achando tudo mais novo?

Ah! Se eu pudesse suicidar-me por seis meses,
morrer em cima de um divã
com a cabeça sobre a almofada,
confiante e sereno por saber
que tu velarias, meu amor do Norte.

Quando viessem perguntar por mim,
havias de dizer com o teu sorriso
onde arde um coração em melodia:
"Matou-se esta manhã.
Agora não o vou ressuscitar
por uma bagatela."

E virias depois, suavemente,
velar por mim, subtil e cuidadosa,
pé ante pé, não fosses acordar
a Morte ainda menina no meu colo..."


José Gomes Ferreira

4 comentários:

click disse...

ó! eu gostei do outro que estava aqui antes deste aparecer...

natalie disse...

a sério? coloco-o de novo!
bjs

Anónimo disse...

Eu gostei do suicídio por 6 meses. Preferível a suspender a democracia!;-)

natalie disse...

suicídio por 6 meses era o que me apetecia agora, hibernar, para esquecer as chatices e frustrações, e acordar no verão, com uma energia solar tão forte que me faria começar e começar e começar, outra, outra e outra vez o circuito da esperança...

é que uma pessoa cansa-se de ser resiliente... às vezes preferia deprimir a sério para ter depois a energia da subida do abismo. como fui criando anti-corpos para a depressão, não saio deste constante "rame-rame"... deste "agora é que vai ser... oh, afinal não foi..."

mas, "a vida vem em ondas como o mar"! o solestício está quase a chegar e com ele a luz, energia, renascimento!