quarta-feira, junho 27, 2007

silêncio

num mundo de barulho constante,
agradeceram-me o silêncio.


(shhhhh!
é preciso calar para ouvir)

obrigada.

segunda-feira, junho 25, 2007

Tu estás aqui

Estás aqui comigo à sombra do sol
escrevo e oiço certos ruídos domésticos
e a luz chega-me humildemente pela janela
e dói-me um braço e sei que sou o pior aspecto do que sou
Estás aqui comigo e sou sumamente quotidiano
e tudo o que faço ou sinto como que me veste de um pijama
que uso para ser também isto este bicho
de hábitos manias segredos defeitos quase todos desfeitos
quando depois lá fora na vida profissional ou social só sou um nome e sabem
o que sei o
que faço ou então sou eu que julgo que o sabem
e sou amável selecciono cuidadosamente os gestos e escolho as palavras
e sei que afinal posso ser isso talvez porque aqui sentado dentro de casa sou
outra coisa
esta coisa que escreve e tem uma nódoa na camisa e só tem de exterior
a manifestação desta dor neste braço que afecta tudo o que faço
bem entendido o que faço com este braço
Estás aqui comigo e à volta são as paredes
e posso passar de sala para sala a pensar noutra coisa
e dizer aqui é a sala de estar aqui é o quarto aqui é a casa de banho
e no fundo escolher cada uma das divisões segundo o que tenho a fazer
Estás aqui comigo e sei que só sou este corpo castigado
passado nas pernas de sala em sala. Sou só estas salas estas paredes
esta profunda vergonha de o ser e não ser apenas a outra coisa
essa coisa que sou na estrada onde não estou à sombra do sol
Estás aqui e sinto-me absolutamente indefeso
diante dos dias. Que ninguém conheça este meu nome
este meu verdadeiro nome depois talvez encoberto noutro
nome embora no mesmo nome este nome
de terra de dor de paredes este nome doméstico
Afinal fui isto nada mais do que isto
as outras coisas que fiz fi-Ias para não ser isto ou dissimular isto
a que somente não chamo merda porque ao nascer me deram outro nome
que não merda
e em princípio o nome de cada coisa serve para distinguir uma coisa das
outras coisas
Estás aqui comigo e tenho pena acredita de ser só isto
pena até mesmo de dizer que sou só isto como se fosse também outra coisa
uma coisa para além disto que não isto
Estás aqui comigo deixa-te estar aqui comigo
é das tuas mãos que saem alguns destes ruídos domésticos
mas até nos teus gestos domésticos tu és mais que os teus gestos domésticos
tu és em cada gesto todos os teus gestos
e neste momento eu sei eu sinto ao certo o que significam certas palavras como
a palavra paz
Deixa-te estar aqui perdoa que o tempo te fique na face na forma de rugas
perdoa pagares tão alto preço por estar aqui
perdoa eu revelar que há muito pagas tão alto preço por estar aqui
prossegue nos gestos não pares procura permanecer sempre presente
deixa docemente desvanecerem-se um por um os dias
e eu saber que aqui estás de maneira a poder dizer
sou isto é certo mas sei que tu estás aqui



Ruy Belo
Toda a Terra
Todos os Poemas
Assírio & Alvim
2000

http://poesiaseprosas.no.sapo.pt/ruy_belo/poetas_ruybelo01.htm

sábado, junho 23, 2007

dizer

queria dizer que.

mas não há que dizer. já tudo foi dito. pensado.
mas não feito.
recolho-me. reservo-me.

preciso de silêncio.

quinta-feira, junho 21, 2007

banda sonora original

http://www.myspace.com/seanrileymusic



sean riley and the slowriders


para ouvir, ouvir, ouvir

domingo, junho 17, 2007

sexta-feira, junho 08, 2007

elevador






pois pois por onde anda o pensamento o corpo que se desfaz e agarra ao corrimão ou devaneio mais fugaz e à rima fácil ao trambolhão à cambalhota ao riso ao choro ao respirar a visão de alguém a conversa que se recria a informação que chega a vida que parte e de lá do outro lado o sonho que chama e a vida que teme pois pois as noites são longas a insónia é terreno fértil para os pensamentos e agora como é sempre a imagem da cidade como um grito que me chama mas não vou nem sei quando voltarei embora as imagens me chamem a descida do elevador a porta de ferro a padaria a curva da rua a praça e o metro depois as avenidas largas o sol e o céu vistos dos jardins altos o mar que vi tão pouco os risos as mãos o corpo a criar a madeira do chão tudo tão familiar e tão meu as conversas sobre arte a poesia o futuro todo a parecer tão fácil e presente pois pois como recuperar o irrecuperável e deitar fora a saudade fazer de novo o dia cada dia ir em frente inventar a vida de novo de novo de novo para além do pensamento para além da insónia para além do medo para além das escolhas que não soube que não sei para além da ausência para além de mim

domingo, junho 03, 2007

que reste-t-il de nos amours






Que reste-t-il de nos amours?
Que reste-t-il de ces beaux jours?
Une photo, vieille photo de ma jeunesse

Que reste-t-il des billets doux
Des mois d'avril, des rendez-vous?
Un souvenir qui me poursuit sans cesse

Bonheurs fanés, cheveux au vent
Baiser volés, rêves émouvants
Que reste-t-il de tout cela?
Dites-le moi

Un petit village un vieux clocher
Un paysage si bien caché
Et dans un nuage le cher visage
De mon passé

(Charles TRENET / Léo CHAULIAC)