quarta-feira, dezembro 07, 2016

golo

"Não sei porque ainda penso em ti. Tanto tempo depois, e ainda me vens ao pensamento, por tudo e por nada. Como hoje, como agora, quando passava em frente ao café da minha rua e um grupo de gente gritou "Goolo!". Imaginei-te. Incrível como as imagens me aparecem, assim, do nada, contigo lá dentro. Custou-me tanto tirar-te daqui, da minha vida, da minha rua, da minha casa, da minha cama. Não sei como é que ainda penso em ti. Mas penso. Imaginei-te num café de beira de estrada, a luz amarelada, inclinado sobre a mesa, frente a uma cerveja e um prato de tremoços, a olhar para o ecrã verde, lá em cima. No balcão alguns homens, as garrafas de "minis", as cascas de tremoços e amendoins a serem atiradas ao chão, as vozes ao fundo, risos, discussões, a que estás ao mesmo tempo alheio e atento. E depois a rapariga, de decote generoso e calções curtos, que passa a varrer o que os homens sujaram, a discutir com eles, chama-te a atenção. Vejo-te a olhares para ela, de soslaio, como quem não olha, e nesse momento já estás a fervilhar. Apetece-te. Imagino-te a seres seduzido por aquela putazinha de subúrbio, ela a mostrar-se, a perguntar-se se queres mais alguma coisa, um sorriso e olhar que dizem tudo. E depois... Depois paro de imaginar. Não quero ver o que vem a seguir. O que suspeitei várias vezes. Os sinais que trazias. Mais do que o sexo, magoou-me a mentira. É talvez por isso que ainda penso em ti. Depois de ti, deixei de confiar."

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