terça-feira, março 30, 2010

não contraries

Se queres ir em frente e um vento forte te empurra para trás
Ou se os teus passos ficam presos na lama,
Não contraries.


Deixa-te ir para trás.
Se calhar, esqueceste-te de alguma coisa que precisas recuperar.
Se calhar, lá atrás, está o que precisas
Para avançar.

segunda-feira, março 29, 2010

ljubljana



(de repente, sem saber como nem porquê, saudades daquele verão, fantástico, em Ljubljana.)

sexta-feira, março 26, 2010

quinta-feira, março 25, 2010

comportamento restaurado

"O comportamento restaurado é o comportamento vivo tratado como um realizador trata um pedaço de filme. Estes pedaços de comportamento podem ser rearranjados ou reconstruídos; são independentes dos sistemas causais (sociais, psicológicos e tecnológicos) que os trouxeram à existência. Têm uma vida própria.
A “verdade” ou “fonte” original do comportamento pode ter-se perdido, ser ignorada ou contrariada – mesmo quando essa verdade ou fonte está aparentemente a ser honrada e observada. Como o pedaço de comportamento foi feito, descoberto ou desenvolvido pode ser desconhecido ou escondido; elaborado; distorcido pelo mito ou tradição.

Usados no processo de ensaios para fazer um novo processo, a performance, estes bocados de comportamento não são eles próprios processo, mas antes coisas, itens, materiais. Podem ser de longa duração, como em alguns dramas e rituais ou de curta duração como certos gestos, danças e mantras.

(O comportamento restaurado) É usado em todos os tipos de performance desde o xamanismo e exorcismo até ao trance, desde a dança ritual à dança estética e teatro, desde ritos de iniciação aos dramas sociais, da psicanálise ao psicodrama. De facto, o comportamento restaurado é a principal característica da performance.

Os praticantes de todas estas artes, ritos, e curas assumem que certos comportamentos – sequências organizadas de eventos, guiões de acções, textos conhecidos, partituras de movimentos – existem separados dos performers que “fazem” estes comportamentos.
Porque o comportamento está separado daqueles que estão a agir, é possível que o comportamento seja armazenado, transmitido, manipulado, transformado. Os performers entram em contacto com, recuperam, recordam, ou mesmo inventam estes pedaços de comportamento e depois vão “comportar-se de novo” (re-behave) de acordo com esses pedaços, seja sendo absorvidos por eles (fazendo o papel, entrando em trance) ou existindo lado a lado com eles (o Verfremdungseffekt de Brecht – efeito de “distanciamento”)
(…)
O comportamento restaurado está “lá fora”, distante de “mim”. É separado e por isso pode “trabalhar-se sobre ele”, ser modificado, mesmo que já tenha “acontecido antes”. (…) O comportamento restaurado é simbólico e reflexivo: não vazio, mas comportamento gravado que reproduz múltiplas significações. Estes termos difíceis expressam um único princípio: o “self” pode agir no/como outro. (…) A performance significa: nunca pela primeira vez. Significa: pela segunda ou pela “n” vez. A performance é um comportamento duas vezes agido (twice-behaved behavior).
(…)
A função dos ensaios no teatro estético é estreitar as escolhas ou pelo menos tornar claras as regras da improvisação. Os ensaios funcionam para construir uma partitura que é um “ritual por contrato”: o comportamento fixado, que todos os que participam acordam fazer.
A partitura pode mudar porque não é um “ evento natural” mas um modelo de escolhas humanas individuais ou colectivas. A partitura existe, como Victor Turner dizia, naquilo que Stanislavsky chamava o “como se”. Existindo como segunda natureza, o comportamento restaurado é sempre sujeito a revisões.
(…)


(adaptado de)
Richard Schechner
A Dictionary of Theatre Anthropology, the secret art of the performer

quarta-feira, março 24, 2010

as acções ficam com quem as pratica





(ontem no programa bairro alto, na rtp, josé mário branco, a propósito dos direitos de autor, contou que um travesti lhe pediu autorização para usar uma das suas músicas com uma letra erótica; coerente com o que defende - que a obra se descola do autor e não deve ser necessário pedir autorização para ser usada - respondeu-lhe que sim porque "as acções ficam com quem as pratica" e são os outros, o público, a comunidade, quem julgará o que foi feito.)

sexta-feira, março 19, 2010

A morta

(...)
"Então, apesar da minha timidez, aproximei-me do grupo e, apontando-lhe o dedo ao peito, disse-lhe:
-Estás morta. Não penses que eu não sei.
Todas as suas amigas se afastaram um pouco, como se tivessem medo de se contagiar, e ela arrastou desde então uma vida solitária, que eu também não tentei aliviar, ainda que ela mo pedisse com os olhos. Casou-se com um morto de fome com quem assiste à missa de defuntos todas as semanas. Continua no bairro e, quando apareço por ali para ver os meus pais, sai-me ao caminho para que a liberte da bolha em que continua presa. Mas agora, mesmo que quisesse, não poderia, porque também eu me fui fechando durante todos estes anos dentro de uma membrana transparente e flexível da qual só poderia resgatar-me uma mulher viva."



Juan José Millás
"Os objectos chamam-nos"

quarta-feira, março 17, 2010

meditação: aleatoriedade

"E se as folhas não caíssem das árvores aleatoriamente? E se houvesse uma ordem na sua queda, qual seria? Haverá "ordem" na aparente "desordem"?
Folhas no alcatrão molhado: folha verde, haste frágil, fundo preto.
A folha saberá, ao cair, que harmonia espalha pelo chão?
O vento determina a queda? O que determina o vento?
Se existisse uma ordem na queda das folhas, também existiria ordem para as minhas escolhas.
Que causalidade há no movimento da natureza? E em mim, como parte dela?"

13-11-02

segunda-feira, março 08, 2010

"up"


estou cansada de ganhar a vida e, egocentrica, gostava que a vida me ganhasse a mim.

ou então, fugir.




quarta-feira, março 03, 2010

Sofia Loren

meditação: forma





Estender o braço e estares lá
Abrir a mão e no espaço vazio
inventar a tua face
Fazer-te real com o apelo dos meus braços
o toque da minha pele
Inventar-te, através do meu corpo dar-te
forma.




(23-4-2003)

segunda-feira, março 01, 2010