terça-feira, dezembro 29, 2009

open




(abrir espaço. respirar. deixar entrar. filtrar. respirar. abrir espaço. escolher. deixar ficar. respirar. abrir espaço. deixar sair. nutrir. respirar. abrir espaço. imaginar. esperar. abrir espaço. respirar. recomeçar. partir. deixar respirar. abrir espaço. arriscar. entrar. respirar. abrir espaço. ficar. expelir. explodir. respirar. abrir espaço.)

sábado, dezembro 26, 2009

quarta-feira, dezembro 23, 2009

natal




gosto do natal, da festa, das prendas, das luzes, do frio, da confusão, da preparação das comidas e dos doces, da expectativa, de pôr a mesa bonita para o jantar, dos brindes, do excesso, do calor, da família, da azáfama, das conversas, do pinheiro e da estrela, do presépio, do pai natal.

(saudades de ir apanhar musgo fresquinho aos muros e caminhos com os meus irmãos, de apanhar bugalhos nos arbustos com a minha avó, de fazer enfeites de papel brilhante com a minha mãe, de derreter velas para lhes dar outra forma, de ir à procura de um pinheiro nas matas com o meu pai, de não termos espaço à mesa em casa da minha avó, do pai natal improvisado - barbas de algodão, robe chinês vermelho - e da encenação à volta da sua chegada à meia noite em ponto).

gosto de tudo o que o natal representa, o (re)nascimento, a recuperação da inocência, a generosidade e a troca, a esperança e a abundância, o excesso e a partilha, o regresso da luz (darmo-nos à luz) e do reflorescimento (o inverno prepara a primavera).


mas nesta era de abundância consumista, e ao mesmo tempo asséptica e maníaca pela saúde tinham de vir uns estudiosos australianos dizer que o pai natal, esse senhor com ar simpático, bonacheirão e generoso deve ser considerado um mau exemplo para as crianças, porque é gordo.

enfim.

o natal é uma festa cíclica, de inverno, que já existia antes de ser o natal cristão. marca a passagem do tempo e os ciclos da natureza, ajuda-nos a estruturar o quotidiano, apontando-nos possibilidades de mudança, crescimento e esperança. incita-nos à generosidade e ao desprendimento, à alegria, expansão e receptividade.


celebremos, então.

bom natal!


(ps: parece que tinha aí um erro de português. nunca fui muito boa em gramática. as minhas desculpas às duas pessoas que me "linkaram".)

segunda-feira, dezembro 21, 2009







"A lógica leva-nos de A a B. A imaginação leva-nos a toda a parte".


Albert Einstein

sábado, dezembro 19, 2009

Kate Winslet (Romance and cigarettes)

quarta-feira, dezembro 16, 2009

sábado, dezembro 12, 2009

miradouro de santa luzia




(...)

MULHER
Poderia comentar de mil maneiras, meu caro senhor mas não vou fazê-lo, deixe-me apenas dizer-lhe que o acho muito atraente. Silêncio Não acredito que o ring the bell please seja uma frase inocente.

HOMEM
Essa agora!

MULHER
É verdade.

HOMEM
Como asssim?

MULHER
Não lhe ocorreu inocentemente, tenho a certeza. No fundo intuiu que uma mulher como eu havia de aparecer-lhe na sua loja disponível para falar consigo sobre a atracção que exerceu sobre ela. Aliás, a frase nem é sua, é um dito comum, é uma frase do mundo.

HOMEM
Nesse caso não tenho que sentir a responsabilidade de que falava há pouco. Um antiquário tem o direito de convidar as pessoas a visitá-lo na sua loja...

MULHER
Ring the bell please!

HOMEM
Lembrei-me, há outros colegas que têm a mesma frase nas portas também.

MULHER
As lojas de antiguidades usam muito a frase, é isso?
Breve silêncio

HOMEM
Mas a senhora entrou aqui livremente.

MULHER
Graças a Deus, mas embora delicada a frase é imperativa. Uma pessoa vai na rua e ring the bell please. Não me vai levar a mal mas gostava de fazer amor consigo.
Breve silêncio.

HOMEM
Mas... mas assim de repente... deve calcular que não estou preparado... uma pessoa abordada assim... de repente... tocam a campainha, a senhora entra e de um momento para o outro e sem que nada o fizesse prever convida-me a fazer amor consigo... desculpe mas não é uma situação que me seja familiar... talvez que possamos conhecer-nos um pouco mais, conversar sobre alguns temas que sejam do nosso agrado, só para estimular um pouco o nosso encontro e depois sim, quem sabe, talvez possamos trocar um beijo e depois...

MULHER
O meu tema favorito é o miradouro de Santa Luzia. Gostaria de falar sobre o miradouro de Santa Luzia?

HOMEM
Com muito gosto, sim, adoro Santa Luzia. Trauteia a melodia popular napolitana Santa Lucia.

MULHER
Levantando-se Tem por acaso algum gabinete na sua loja, um espaço mais íntimo?

HOMEM
Sabe, tenho receio duma coisa... Breve silêncio.

MULHER
Não está capaz de o dizer? Breve silêncio.

HOMEM
Indicando-le uma direcção. Tenho receio que você seja o amor da minha vida.

MULHER
Avançando para o escuro E então?

HOMEM
Seguindo atrás dela Terei que substituir a frase na porta...

Desparecem os dois no escuro. Ouve-se pouco depoi o som, breve, da campainha.





Abel Neves
"Ring the bell please", Além as estrelas são a nossa casa


terça-feira, dezembro 08, 2009

Catherine Deneuve

domingo, dezembro 06, 2009

livros






"Já ofereci livros a algumas pessoas. Talvez em quatro ou cinco ocasiões. Quer dizer, já ofereci livros mais vezes; neste caso refiro-me a oferecer livros dos meus livros, o que é muito diferente. Numa dessas ocasiões voltei a comprar o mesmo livro. Sem o ler de novo, coloquei-o exactamente no mesmo lugar onde estava o outro.

Não faço ideia da relação que as pessoas estabelecem com os seus livros. No meu caso, aquele segundo livro, sem as folhas reviradas por mim, sem as notas que por vezes deixo nas margens, já não é o "meu" livro. Não o tendo cheirado, manuseado, já não é a mesma coisa. (...)

Os livros, tal como as fotografias (aquelas em papel), envelhecem. Como nós, têm o seu ritmo; o que faz deles uma espécie de companheiros de viagem. Por isso, vai ser sempre muito complicado para mim guardar um ficheiro informático como se fosse um livro, e trocar a estante por uma pasta no computador. (...)

E vocês, aqueles poucos a quem ofereço os meus livros, podem ficar descansados: nunca vão receber como presente uma pasta com um ficheiro dentro. Pois cada vez que vos der um livro, é como se vos estendesse a mão para embarcarmos juntos."





(Tenho a sorte de fazer parte das pessoas a quem já ofereceste dos teus livros, e, eu que sou incapaz de me separar de um livro de que goste (e mesmo dos que não gosto...), sempre achei esse acto de uma incrível generosidade, quando, ainda por cima, ofereces, com o livro, essas tuas marcas tão pessoais, a tua "leitura".

Também me acontece custar separar-me de um livro que me foi emprestado e ter de ir logo a seguir comprar outro igual. Aconteceu, por exemplo, com a "Insustentável leveza do ser" depois de ter lido o teu, cheio de sublinhados e notas nas margens. O que comprei depois, limpo, que nunca foi verdadeiramente lido, tem as mesmas palavras, mas não é o mesmo livro, porque não foi o livro que eu li.

Já li alguns livros em ficheiro, mas, de facto, não é a mesma coisa; nem imprimido é a mesma coisa. E faltará sempre o cheiro. Há dias, numa livraria, na secção infantil, estive longos minutos a cheirar um livro com ilustrações porque tinha o mesmo cheiro dos meus livros em criança: o prazer de desembrulhar uma prenda e ser um livro, folhear e cheirar esse livro novo e depois torná-lo nosso, lendo-o, é insubstituível.
Os ambientalistas que procurem outro alvo e deixem os livros em paz.)





sexta-feira, dezembro 04, 2009

terça-feira, dezembro 01, 2009

brincar aos médicos




Kevin McKidd





Anatomia de Grey: razão para ver.

domingo, novembro 29, 2009

quinta-feira, novembro 26, 2009

“fico admirado quando alguém, por acaso e quase sempre
sem motivo, me diz que não sabe o que é o amor.
eu sei exactamente o que é o amor. o amor é saber
que existe uma parte de nós que deixou de nos pertencer.
o amor é saber que vamos perdoar tudo a essa parte
de nós que não é nossa. o amor é sermos fracos.
o amor é ter medo e querer morrer.”



José Luís Peixoto
A criança em ruínas

domingo, novembro 22, 2009

terça-feira, novembro 17, 2009

risque o que não interessa

idiossincrática tímida serena inadaptada simples lenta ansiosa interessada corajosa amiga inconformada leal complicada que-ferve-em-pouca-água interessante certinha a-rebentar luminosa curiosa parada energética cerebral leve cobarde intuitiva encaracolada com-pés-na-terra complexa prolixa do-contra hipócrita brincalhona espontânea autoritária sintética histérica sensata surda controlada criativa assertiva solidária reservada aberta tolerante esquecida voraz compreensiva sonhadora abrangente ignorante prática conformada inteligente emotiva indecisa pensativa mulher em-paz inconstante sensível paranóica musical incansável faladora investigadora fraude receosa racional volátil conservadora medricas conversadora libertária familiar selvagem atenta estudiosa altruísta intensa amante impertinente iludida aérea convencional assimétrica fácil esotérica dura-de-roer melancólica furtiva revoltada concentrada em-experiência egocêntrica risonha generosa diferente preguiçosa rítmica ao-lado alegre utópica sem-ouvido antiga de-esquerda ligada dispersa retraída responsável meditativa quente bem-humorada yogui sedutora transformadora teimosa ingénua com-caroço deprimida explosiva consensual fria pequena do-campo cheia receptiva sumarenta fútil friorenta perdida imparcial zangada à-espera solitária encantada insegura louca dedicada dorminhoca altiva simpática flexível terra-a-terra dura na-defensiva persistente rabugenta tradicional baixinha actual sábia maldosa chorona avançada resolvida espiritual à-procura lutadora naif secreta vazia simples livre tímida idiossincrática...




tudo isto ou nada disto: risque o que não interessa

sábado, novembro 14, 2009

Jack Vettriano

quarta-feira, novembro 11, 2009

ética

Lobo Ibérico






hoje transformei-me em bicho.


acontece sempre que atacam uma das coisas para mim mais sagradas: a minha ética.


quanto mais (des)conheço as pessoas, mais gosto dos lobos.

arte, música, emoções, amor e evolução





Para ver com tempo.

segunda-feira, novembro 09, 2009

"A Viagem"

"A Viagem" ganhou a final do concurso nacional de teatro amador do Inatel, no Teatro Pax Julia, em Beja.

( obrigada por teres ido e palas fotografias lindas! um dia, com mais calma, conversamos sobre a "cultura amadora", seja lá o que isso for :) )


sexta-feira, novembro 06, 2009


"Todos os homens se nutrem, mas poucos sabem distinguir os sabores."

Confúcio




Há coisa de duas semanas tive uma experiência com uma conhecida empresa de produtos alegadamente naturais e nutritivos que servem basicamente para emagrecer. Calma, eu não me acho gorda. Acontece que recebi um convite para o que pensava ser a inauguração de um restaurante e acabei a beber chá e um "batido nutritivo" numa sala de um apartamento, numa roda de pessoas que bebiam chá e batidos e partilhavam a sua experiência ao género dos grupos de auto-ajuda.

Mal entrei e me pediram o nome e número de telefone, desconfiei. Recusei dar a minha data de nascimento e dei o número de telefone do meu emprego, mas não consegui voltar para trás e, confesso, tinha alguma curiosidade em saber como aquilo se passava.
Durante algum tempo eu fui a única pessoa "nova" na sala, os outros já eram clientes habituais e, por isso, as atenções estavam voltadas para mim, para me convencerem das vantagens em passar a almoçar chá e "batidos". E era tudo fantástico! todos eram formidáveis e maravilhosos! todos falavam dos produtos como se de um novo deus! uns tinham emagrecido, outros engordado, outros ainda sentiam-se menos rabujentos e mais satisfeitos consigo próprios! tudo com muitas exclamações, muito americano, muito motivacional, muito "Dale Carnegie".

O chá era bom, o batido, com sabor ligeiramente achocolatado, até se bebia. Passei a tarde a beber água e a correr para a casa de banho e, como me garantiram, senti-me saciada, leve e energética. Se continuasse a fazer o "programa" provavelmente emagreceria por estara a consumir tantos líquidos, o que, apesar de não estar gorda, faria bem à minha auto-estima, nem que fosse por conseguir voltar a caber nas calças de ganga de há dois anos.

Não faço a mínima ideia de que é feito o "batido nutritivo", mas até acredito que seja um bom produto, realmente nutritivo e blá-blá-blá. Mas o grande truque é mesmo a conversa. Apesar da minha desconfiança inicial, tentei manter-me receptiva e dei por mim quase embalada naquela "música". Alguém deprimido, com falta de auto-estima, insatisfeito com o seu corpo, facilmente se deixará levar pelo discurso motivacional que, aliado aos resultados alcançados, transforma o consumo daqueles produtos numa verdadeira "seita". Como todas as "vendas em pirâmide", aliás.
Como não voltei no dia seguinte, telefonaram-me. Delicadamente informei que não estava interessada em continuar. Se tivesse voltado, correria o risco de me tornar "uma delas", passaria a andar com autocolantes no carro e pins na lapela.

Ou não.

Porque, apesar de ser péssima cozinheira, adoro comer. Gosto de ter os alimentos na boca, de os mastigar, de saborear, de engolir, de sentir que, quando os como, começam a fazer parte de mim. Gosto do acto social de nos sentarmos à mesa para partilhar uma refeição cozinhada e preparada para aquele momento. Quando alguém nos oferece uma comida que cozinhou está a dar-nos, também, um pouco de si, do seu tempo, da sua criatividade e sensibilidade, oferece-nos o prazer e a possibilidade de comer.
E é também por isso que não tenho restrições alimentares que só farei se, por motivos de saúde, for obrigada. Como de tudo, carne, peixe, frutas, legumes, chinês, marroquino, indiano, fast-food, feijoada brasileira e cozido à portuguesa.
Já tentei ser vegetariana mas não senti necessidade de continuar a ser só vegetariana, embora tente comer carne com moderação. Cresci no campo, vi matanças de porco, torcer pescoços de galinhas e esfolar coelhos e as razões éticas para não comer animais, que admiro nos meus amigos vegetarianos, não me estão no sangue. Tento ser, como me disse uma amiga, "instintívora", ou seja, comer aquilo que o corpo "nos pede" em cada momento.
Claro que, encontrar o ponto de equilíbrio para comer bem e o que gostamos sem que nos faça muito mal, nomeadamente sem engordar muito, é muitas vezes uma tarefa difícil. E um dia pode ser necessário recorrer a medicamentos, dietas, chás ou "batidos nutritivos", desde que não nos faça mal, nos vicie, ou nos obrigue a uma lavagem ao cérebro.

quarta-feira, novembro 04, 2009

segunda-feira, novembro 02, 2009

sexta-feira, outubro 30, 2009

quinta-feira, outubro 29, 2009

A aula

"Púchkov disse:
- A mulher é uma máquina do amor.
E apanhou logo com um murro nas ventas.
- Para que foi isso? - perguntou Púchkov.
Mas como não obteve resposta, continuou:
- O que eu penso é o seguinte: a mulher deve ser abordada por baixo. Efectivamente, as mulheres gostam disso e apenas fingem não gostar.
Nesse momento Púchkov levou outra vez nas ventas.
- Mas o que é isto, camaradas? Se continuam assim, eu interrompo já a aula - declarou Púchkov.
Porém, após uma pausa de uns quinze segundos, prosseguiu:
-A mulher é feita de tal maneira que é muito suave e húmida.
Neste momento Púchkov levou outra vez nas ventas.
Tentou fingir que não tinha reparado e continuou:
- Basta cheirarmos uma mulher...
Mas neste momento Púchkov apanhou tremenda murraça nas ventas que levou a mão à cara e declarou:
- Camaradas, é absolutamente impossível dar uma aula nestas condições. Se voltar a acontecer, suspendo-a.
Púchkov aguardou uns segundos e prosseguiu:
- Ora, onde íamos nós? Ah, pois. Temos portanto que a mulher gosta de se olhar. Senta-se diante do espelho toda nua...
Àquela palavra, Púchkov levou mais um murro nas ventas.
- Toda nua! - repetiu Púchkov.
Trás! Apanha ele nas ventas.
- Toda nua! - gritou Púchkov.
Trás! Leva ele nas ventas.
- Nua! Nua! Uma mulher nua! Uma gaja toda nua! - pôs-se Púchkov aos gritos.
Trás! Trás! Trás! Apanha ele nas ventas.
- Uma gaja toda nua com um tacho na mão!
Trás! Trás! choviam as pancadas em cima de Púchkov.
- O olho do cu de uma gaja! - gritava Púchkov, desviando-se da pancada. - Uma freira nua!
Mas neste momento Púchkov levou com tanta violência que perdeu os sentidos e caiu por terra, como que abatido.


12 de Outubro de 1940

Daniil Kharms, "Três horas esquerdas"
(Marionet 2001)

segunda-feira, outubro 26, 2009

sexta-feira, outubro 23, 2009

A Velhice do Padre Eterno

«Jehovah, por alcunha antiga o Padre Eterno
Deus muitissimo padre e muito pouco eterno,
Teve uma ideia suja, uma ideia infeliz:
Poz-se a esgaravatar co-o dedo no nariz,
Tirou d'esse nariz o que um nariz encerra,
Deitou depois isso cá baixo, e fez a terra.
Em seguida tirou da cabeça o chapeu,
Pol-o em cima da terra, e zás, formou o céo.
Mas o chapéu azul do Padre Omnipotente
Era um velho penante, um penante indecente,
Já muito carcomido e muito esburacado,
E eis ahi porque o céo ficou todo estrellado.
Depois o Creador (honra lhe seja feita!)
Achou a sua obra uma obra imperfeita,
Mundo serrafaçal, globo de fancaria,
Que nem um aprendiz de Deus assignaria,
E furioso escarrou no mundo sublumar,
E a saliva ao cahir na terra fez o mar.
Depois, para que a Egreja arranjasse entre os povos
Com bulas da cruzada alguns cruzados novos,
E Tartufo podesse inda d'essa maneira
Jejuar, sem comer de carne á sexta feira,
Jehovah fez então para a crença devota
A enguia, o bacalhau e a pescada marmota.
Em seguida metteu a mão pelo sovaco,
Mais profundo e maior que a caverna de Caco,
E arrancando de lá parasitas extranhos,
De toda a qualidade e todos os tamanhos
Lançou sobre a terra, e d'este modo insonte
Fez elle o megatheiro e fez o mastodonte.
Depois, para provar em summa quanto póde
Um Creador, tirou dois pellos do bigode,
Cortou-os em milhões e milhões de bocados,
(Obra em que elle estragou quatrocentos machados)
Dispersou-os no globo, e foi d'esta maneira
Que nasceu o carvalho o platano e a palmeira.

Por fim com barro vil, assombro da olaria!
O que é que imaginaes que o Creador faria?
Um pote? não; um bicho, um bipede com rabo,
A que uns chamam Adão e outros Simão. Ao cabo
O pobre Creador sentindo-se já fraco.
(Coitado, tinha feito o universo e um macaco
Em seis dias!) pensou: — Deixem-nos de asneiras.
Trago já uma dôr horrivel nas cadeiras,
Fastio... Isto dá cabo até d'uma pessoa...
Nada, toca a dormir uma sonata boa!
Descalçou-se, tirou os oc'los e chinó,
Pitadeou com delicia alguns trovões em pó,
Abriu, para cahir n'um somno repentino,
O alfarrabio chamado o livro do Destino.
E enflanelando bem a carcassa caduca,
Com o barrete azul celeste até á nuca,
Fez ortodoxamente o seu signal da cruz
Como qualquer de nós, tossiu, soprou á luz,
E de pança p'ro ar, n'um repoiso bemdicto,
Espojou-se, estirou-se ao longe do infinito
N'um immenso enxergão de nevoa e luz doirada.
E até hoje, que eu saiba, inda não fez mais nada.»


Guerra Junqueiro




(também não conhecia. ;-) )

quinta-feira, outubro 22, 2009

guerreiro





mais fundo, para dentro, para o fundo.


não te mexas. fica quieta
quando tudo se agita.


no vazio escolhe.


procura a espada,
o arco e a flecha.


vê-te na postura
do guerreiro.


é aí que estás.



(9-9-09)

quarta-feira, outubro 21, 2009

às voltas com a vida

Artur Vaz Oliveira


(...)
Presa à liberdade

Encontramos a Susana a ensaiar o seu número, suspensa num cabo e bem próxima do topo do chapitô. O aparato é uma estrutura metálica em forma de lágrima onde se fazem algumas exibições de contorcionismo.

Apesar de trabalhar nas alturas com as fitas e a corda, Susana mostra algum receio. Não tem muita prática neste número e o aparato, construído para uma pessoa de maior estatura, traz-lhe alguma insegurança. Esforça-se por ensaiar uma coreografia onde se sinta mais à vontade. "Mais logo, com a casa cheia, tudo será mais fácil, é o público que nos faz... e o trabalho... claro...!" É aplicada e exigente. O filho, Aníbal, com 4 anos, observa, atento, e pede-lhe que não caia.


A Susana é o Circo. São 34 anos de entrega a um amor seguro e, ainda que a razão, por instantes, a tenha empurrado por outros caminhos, confessa que é no palco “onde me sinto em casa. Mesmo com 40 graus de febre estou lá a picar o ponto, preciso das pessoas, dos aplausos. O Circo será sempre a minha vida”.

Perfeccionista, sente falta das pequenas "multas" aplicadas pela direcção do circo há uns anos atrás: "não se deve entrar em palco de uma forma descuidada... é imperdoável que alguém se apresente com uma meia rota ou um fato sujo!" (...)


Texto: Artur Vaz Oliveira/Natália Cardoso; Fotos: Artur Vaz Oliveira


ler o texto completo aqui.



(Nota: Quando "entrei" neste projecto já o Artur tinha feito um belo trabalho de campo do qual resultaram as fotos e as descrições do que viu e conversou com os artistas. A minha contribuição cingiu-se a alguns aspectos históricos sobre o circo.)

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domingo, outubro 18, 2009

sábado, outubro 17, 2009

eram as estrelas, caminhante,
o mapa que não soubeste decifrar
mas vais continuar e continuar
perdido para sempre.


José Luís Peixoto, A criança em ruínas

quinta-feira, outubro 15, 2009


Jackson Pollock

domingo, outubro 11, 2009

and now, for something completly different (10)


marge simpson na playboy de novembro: não percam isto, rapazes! :)

sexta-feira, outubro 09, 2009

decisões

"Não são as ideias nem as decisões que importam - interessam, mas não importam. É a convicção. É o convencimento. Qualquer decisão é mais eficaz do que a inteligência. O pensamento é um luxo e um atraso.

Há uma experiência que estão sempre a repetir. Quando se remove o córtex a um bicho qualquer, ele deixa de pensar e de duvidar; de se sentir seguro ou não; de medir as oportunidades. E qual é a consequência? Torna-se imediatamente o chefe dos outros bichos. Os pensadores, no reino animal, são seguidores. Foi o que aconteceu com as pessoas com as piores ideias do século XX: Hitler, Estaline, Mao. Foram as que tiveram mais poder e mais mal fizeram. Porque não hesitavam e o nobre ser humano, hesitante, não resiste a quem não hesita.

Cada vez mais se ouve dizer que qualquer decisão, por muito estúpida ("vou deixar crescer um bigode!"), é mais benéfica do que a dúvida mais inteligente. Na verdade, a pessoa inteligente só decide por instantes. A decisão é emitida como os talões de estacionamento. Pode (e deve) mudar a qualquer momento porque, felizmente, nunca se sabe. Aprende-se a não saber. Aprende-se a viver com isso. Aprende-se a ser enganado, de vez em quando, quando se acerta nalguma coisa.

Recuperamos de ter tido razão, naquela vez sem exemplo. Passa-nos. Esquece-nos. A convicção é convincente, mas é perigosa, por ser o contrário da inteligência e da condição humana, que é não ter bem a certeza de quase nada.

Custa - mas assim é que é bonito."


Miguel Esteves Cardoso
um destes dias, no Público



(não estou a conseguir tomar decisões e a máxima que costumo usar - "quando não sabes o que fazer, não faças nada" - também não está a resultar. e não estou a falar de grandes decisões, neste momento a dificuldade atinge as coisas pequeninas e mesquinhas do dia a dia - talvez tenha havido aqui um contágio, e não conseguir decidir sobre as "coisas grandes" tenha invadido as decisões mais quotidianas: o que vestir, o que comer, o que fazer com o tempo de trabalho e o tempo livre. é um coisa perigosa: se por um lado não tomo decisões erradas, também não tomo as certas, fico só por aqui, à espera.)


quinta-feira, outubro 08, 2009

sos


Enfim S.O.S. - Sérgio Godinho





Triste, é muito triste
é demasiado triste
quando
de tudo o que existe
tudo parece
do triste vermelho do S.O.S.

Mais vale estar só
grito num sufoco
socorro, corri
p'ro teu lábio louco
lábios murmurando "enfim S.O.S."

S.O.S.
parece que só se ouve essa palavra
vem de todos os lugares
vem dos mares, vem dos lares
dos altares, dos bazares
vêm alarmes similares
parece que só se ouve essa sirene
fala perene
dentro da nossa voz

Vou de elevador
rumo ao meu oitavo andar
quem, no gravador
dirá que me quer falar?
"Fale só depois do bip: S.O.S. ..."

Nunca ouvi essa voz
p'lo menos que me lembre
desço até à rua
em busca de um timbre
todos me soam iguais: S.O.S. ...

S.O.S.
parece que só se ouve essa palavra
vem de todos os lugares
vem dos mares, vem dos lares
dos altares, dos bazares
vêm alarmes similares
parece que só se ouve essa sirene
fala perene
dentro da nossa voz

Esse que me parece
ser o destino
faz tanta pirueta
e depois o pino
e lê-se ao contrário também: S.O.S.

S.O.S.
parece que só se ouve essa palavra
vem de todos os lugares
vem dos mares, vem dos lares
dos altares, dos bazares
vêm alarmes similares
parece que só se ouve essa sirene
fala perene
dentro da nossa voz

quarta-feira, outubro 07, 2009

"vender emoções"

A fadista Kátia Guerreiro num anúncio publicitário a um banco "disfarçado" de entrevista, diz, a propósito de ser médica e cantora o seguinte:

"Se vivesse só da música sentiria que estaria a vender as minhas emoções. Quero sempre sentir que sou uma mulher livre e que vou para cima do palco para partilhar."

Acho esta afirmação uma absoluta falta de respeito para com os artistas que vivem do seu trabalho e um profundo desconhecimento do que é ser artista.


Nada contra o facto de acumular as duas profissões, pode até ser uma mais valia para o trabalho criativo, embora acredite que os grandes artistas, os geniais, dificilmente podem, porque não conseguem, fazer outra coisa além do seu trabalho em arte. Aliás, será assim que se conseguem as obras de génio, com essa total dedicação, quantas vezes com sacrifícios inimagináveis. (Há sempre excepções, claro.)

Agora, parece-me que nesta afirmação a fadista considera "desprestigiante" viver apenas da música (ou de qualquer outra arte) porque quem o faz "vende as suas emoções".

Pois vende. Porque as emoções são a matéria prima do artista, são o seu trabalho. E como todo o trabalho deve ser pago.

Além disso, não me parece que a Kátia Guerreiro "partilhe" as suas emoções de graça...

terça-feira, outubro 06, 2009

oxossi







(prenda atrasada para os meus irmãos que fizeram anos sexta feira :) e recordar as intermináveis viagens de férias para o Algarve a ouvir uma cassete onde constava este fantástico cavaleiro de aruanda, a balada do louco e outras tantas canções brasileiras dos anos 60. saravá!)




e já agora, sobre oxossi:

"Oxóssi é o arquétipo daquele que busca ultrapassar seus limites, expandir seu campo de ação, enquanto a caça é uma metáfora para o conhecimento, a expansão maior da vida. Ao atingir o conhecimento, Oxóssi acerta o seu alvo. Por este motivo, é um dos Orixás ligados ao campo do ensino, da cultura, da arte. Nas antigas tribos africanas, cabia ao caçador, que era quem penetrava o mundo "de fora", a mata, trazer tanto a caça quanto as folhas medicinais. Além, eram os caçadores que localizavam os locais para onde a tribo poderia futuramente mudar-se, ou fazer uma roça. Assim, o orixá da caça extensivamente é responsável pela transmissão de conhecimento, pelas descobertas. O caçador descobre o novo local, mas são os outros membros da tribo que instalam a tribo neste mesmo novo local. Assim, Oxóssi representa a busca pelo conhecimento puro: a ciência, a filosofia. Enquanto cabe a Ogum a transformação deste conhecimento em técnica.

Apesar de ser possível fazer preces e oferendas a Oxóssi para os mais diversas facetas da vida, pelas características de expansão e fartura desse orixá, os fiéis costumam solicitar o seu auxílio para solucionar problemas no trabalho e desemprego. Afinal, a busca pelo pão-de-cada dia, a alimentação da tribo costumeiramente cabe aos caçadores.

Por suas ligações com a floresta, pede-se a cura para determinadas doenças e, por seu perfil guerreiro, proteção espiritual e material."

segunda-feira, outubro 05, 2009

cindy sherman

quinta-feira, outubro 01, 2009

outra vida





Despediu-se e chorou.

“Filho, não olhes para mim, que estou a chorar.”

Os olhos grandes do menino procuram os da mãe, confirmam as lágrimas.

“Não olhes para mim.
A mãe tem dói-dói na cara, não é nada, filho.”

Limpou as lágrimas e despediu-se.
Deram-lhe um livro, uma ponte, uma companhia.
Com as mãos ainda húmidas acariciou o livro, sentiu-lhe o peso.
Era preciso compor tudo o que estava estragado.

“Não olhes para mim.
Não fiques aí a olhar, filho.”

A paisagem quieta na janela do comboio. O livro nas mãos, páginas paradas à espera, os olhos que voam, o livro, a janela, a criança.
Lá, onde chegar, terá tempo. Outra vida.


(2004)

super-heroínas




http://www.carminagaleria.com/exposicoes/andrea_inocencio

solitude



"Little do men perceive what solitude is, and how far it extendeth. For a crowd is not company, and faces are but a gallery of pictures, and talk but a tinkling cymbal, where there is no love."


Francis Bacon



( obrigada por me compreenderes tão bem.)

terça-feira, setembro 29, 2009


em queda livre.









(merda, que isto nunca mais passa.
a depressão é o preço da minha cobardia.)

sexta-feira, setembro 25, 2009

quinta-feira, setembro 24, 2009

marias

"Os estragos que um homem pode fazer na vida de uma mulher. Eu conto. A Maria vive com uma irmã mais nova que é deficiente e muda. A pobre passa os dias a comer caramelos e a brincar com bonecas. Volta e meia, porém, amarinham-lhe uns calores pelo corpo e esquece-se das bonecas. Põe-se, muito oferecida, à janela a meter-se com os homens que passam na rua. Como não fala, gesticula e afaga o baixo-ventre. Às vezes, lança uns grunhidos de foca. Há coisa de dois anos, a irmã da Maria apareceu grávida."


ler tudo aqui (Ana de Amesterdam)

terça-feira, setembro 22, 2009

sexta-feira, setembro 18, 2009

pub





(retirada do facebook de uma amiga que já pôs a mochila as costas).

quinta-feira, setembro 17, 2009

terça-feira, setembro 15, 2009

Mar Musa



(...)
"É a mais extraordinária das igrejas, no cimo de uma montanha, no deserto.

E quando saímos para o terraço, é o mais extraordinário dos céus, sem lua, sem nuvens, só milhões de estrelas muito brilhantes, como se estivessem mesmo aqui.

Hummus, azeitonas, pão, pepinos, chá, é o jantar. A loiça levanta-se, mas só se lava na manhã seguinte, é a regra. Paolo chega, enfim, com uma das monjas, Huda, e outros acompanhantes.

Há quem durma no terraço mais alto, com todas aquelas estrelas por cima, virando o colchão para onde o sol vai nascer.

Paolo do deserto

Às seis da manhã as montanhas parecem ouro. Quem dormiu cá fora, arruma colchões e lençóis. Vindo do anexo dos homens, o sírio namorado de uma holandesa já está pendurado no parapeito, à espera que ela acorde.

A missa das sete e meia atrasa. Mas quando começa os monges estão todos vestidos de branco, com Paolo a presidir. É uma longa missa, de novo com cânticos, leituras a várias vozes, incenso e velas, e partes conversadas.

- O Ramadão é um bom tempo para rezar pela e com a comunidade islâmica - diz Paolo.

A luz da manhã bate no chão, fazendo brilhar os frescos.

São quase dez quando saímos da igreja.

Paolo vai fritar ovos para o pequeno-almoço, para umas 20 pessoas.

E, quebrado o jejum, passamos o resto da manhã a conversar.

Italiano vindo das lutas de esquerda, filho de cristãos empenhados, tinha 30 anos quando entrou para os jesuítas. Estudou árabe e siríaco e esteve no Líbano durante a invasão israelita, a ajudar os libaneses. No fim dos anos 80 veio aqui. Tinha ouvido falar deste mosteiro.

- Estava tudo partido. Tive de forçar a porta. E depois quando entrei na igreja fiquei atónito. Era já de noite e não havia tecto. Vi aqueles frescos e um incrível tecto de estrelas.

Ficou para dormir. Comeu plantas, fez fogo, ferveu água.

- Sou um homem da montanha, um escuteiro. Fiquei dez dias. Vieram caçadores muçulmanos e ofereceram-me a comida deles. Percebi a relação dos muçulmanos com o mosteiro.

E percebeu que este era o lugar para os três votos: vida espiritual, trabalho manual e hospitalidade.

- A hospitalidade é realmente o nosso programa político. Só através dela pode ser conseguido um humanismo desenvolvido. Sem hospitalidade, a tentação do suicídio torna-se muito forte para mim, a vida torna-se insuportável. Porque estamos aqui? Pela hospitalidade. A prática do diálogo começa na curiosidade. Acreditar que o outro tem algo para oferecer.

E antes do almoço vai juntar lençóis usados, daqueles que vieram dormir por uma noite. "


Alexandra Lucas Coelho

in Público - Mar Musa Um fim-de-semana com os novos padres do deserto



sábado, setembro 12, 2009

I ching




23. A desintegração


24. O retorno/ regresso







quinta-feira, setembro 10, 2009

terça-feira, setembro 08, 2009






(dou por mim a ser cínica. e não gosto. a maturidade, o cansaço, o vazio, a rotina, têm destas coisas. é triste perder a ingenuidade. é triste deixar de acreditar.)

segunda-feira, setembro 07, 2009

all about eve









a incomparável Bette Davis

sábado, setembro 05, 2009

"let's look at the trailer"

(HD) EMBARGO (trailer) - um filme de António Ferreira, a partir da obra homónima de José Saramago from Zed Filmes on Vimeo.








(ansiosa por ver os meus queridos Cláudia e o Filipe no grande ecrã! pena que a estreia é só em 2010.)

sexta-feira, setembro 04, 2009

obsessão




Yayoi Kusama

quinta-feira, setembro 03, 2009

quase

Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!

De tudo houve um começo ... e tudo errou...
- Ai a dor de ser - quase, dor sem fim...
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se enlaçou mas não voou...

Momentos de alma que, desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...

Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...



Mário de Sá-Carneiro

quarta-feira, setembro 02, 2009

fogo

toquei o fogo e soube tirar
a mão antes de me queimar

mas devia ter ardido logo
toda
inteira
para não ter agora
de enfrentar a dor fantasma
de um corpo por incendiar
.

save me

domingo, agosto 30, 2009

sexta-feira, agosto 28, 2009



22 segundos
de arte pela barbárie


http://www.youtube.com/watch?v=krP8z80zAnw

http://www.estadao.com.br/arteelazer/not_art425091,0.htm

mulher feia

"- A vida é muito curiosa - disse, expelindo o fumo pelo nariz. - Eu daria um perfeito homem e sou completamente mulher e ainda por cima mulher feia. Apesar disso os homens amaram-me e eu amei muitos homens. Curioso! Ouve, Inglés, que é interessante. Olha para mim feia como sou. Olha bem para mim, Inglés.
- Tu não és feia.
- Qué no? Não me mintas. Ou - e ela teve uma das suas profundas gargalhadas - já estás enfeitiçado? Não. Estou a brincar. Olha para esta fealdade. Pois apesar disso temos nós um sentimento que cega um homem enquanto está apaixonado. Com esse sentimento cegamo-lo e cegamo-nos a nós mesmas. Mas lá vem um dia em que, sem razão nenhuma, o homem vê como a mulher é feia, feia como realmente é; e a mulher vê-se tão feia como o homem a vê e então perde o homem e também os tais sentimentos interiores. Compreendes, guapa? - E bateu no ombro da rapariga.
- Não - respondeu Maria, - porque tu não és feia.
- Procura usar a cabeça e não o coração e ouve, menina. Estou a dizer coisas muito interessantes. Isto não te interessa, Inglés?
- Sim, mas temos que partir.
- Qué va, partir. Estou aqui muito bem - e Pilar continuou dirigindo-se a Robert Jordan como se estivesse diante de um pequeno auditório ou como se falasse a alunos: - E então passado algum tempo, quando se é feia como eu, tão feia quanto uma mulher o pode ser, então, dizia eu, ao fim de um certo tempo, o sentimento, o sentimento idiota da beleza interna cresce novamente. Cresce como uma couve. E então, quando o sentimento está bem desenvolvido, aparece outro homem e acha a mulher bela e tudo recomeça. Agora creio que ultrapassei tudo isto, mas a coisa ainda pode voltar. Tu tens sorte, guapa, em não seres feia."


Ernest Hemingway, " Por quem os sinos dobram"

quinta-feira, agosto 27, 2009

terça-feira, agosto 25, 2009

desistir

"(...) Pode então haver um momento em que o mundo pára. A idade pára. É nesse instante que se pode pensar: nunca quis ser aquilo em que me tornei, quis sempre não ser aquilo em que me tornei. Com o mundo completamente parado, com a idade parada, não é difícil parar também e, rodeados de fragmentos: uma existência inteira feita de vidro estilhaçado e espalhado no chão: o mais natural é baixarmo-nos sobre os calcanhares, pousar os cotovelos sobre os joelhos dobrados e, com cuidado, esticar as mãos para, com a ponta dos dedos, se começar a escolher cada fragmento, distinguir o que se deve abandonar do que se deve manter. Desistir não é sempre mau. Há vezes em que não se pode evitar. Todos nos dizem continua, continua, mas é o mundo que desiste, inteiro, à nossa volta.


Uma única vida é pouco. Para se fazer aquilo que se sabe e se pode e se quer e se deve fazer é preciso deixar muitas outras coisas para trás. Essa é a conclusão a que se chega logo no fim da adolescência. Quando os números deixam de ser números. Trinta, quarenta, cinquenta anos. As gerações sucedem-se. Os degraus de uma escada rolante que desaparecem lá em cima enquanto subimos, subimos, olhamos para trás e ainda vemos o primeiro degrau, quase como quando tínhamos acabado de chegar e, no entanto, continuamos a subir e vemos já o fim. Os nossos avós mortos, os nossos pais mortos, nós, os nossos filhos, os nossos netos. E, se existir um horizonte, podemos olhá-lo e perceber finalmente que estamos parados no tempo e que o tempo, nesse presente definitivo, está parado dentro de nós. (...) "

José Luís Peixoto

(texto completo aqui)

segunda-feira, agosto 24, 2009

o duche




http://www.carlosmartinez.es

terça-feira, agosto 18, 2009

corpos



Sasha Waltz, noBody




Pilobolus, Symbiosis






Jon Fosse, All that jazz

segunda-feira, agosto 17, 2009

o dos outros





(ilustração da Ana Oliveira )

por vezes gostava de ser mais emotiva, passional, fazer uma cena, ficar amuada.

mas não sou assim.

mudo de parágrafo, de página, de livro.

há tantas frases que quero, preciso escrever.

domingo, agosto 16, 2009

harvest moon





Come a little bit closer
Hear what I have to say
Just like children sleepin
We could dream this night away.

But theres a full moon risin
Lets go dancin in the light
We know where the musics playin
Lets go out and feel the night.

Because Im still in love with you
I want to see you dance again
Because Im still in love with you
On this harvest moon.

When we were strangers
I watched you from afar
When we were lovers
I loved you with all my heart.

But now its gettin late
And the moon is climbin high
I want to celebrate
See it shinin in your eye.

Because Im still in love with you
I want to see you dance again
Because Im still in love with you
On this harvest moon.



( se há coisas perfeitas, esta é uma. obrigada! )

sábado, agosto 08, 2009

my body is a cage


Arcade Fire - My Body Is A Cage - Arcade Fire



My body is a cage
That keeps me from dancing with the one I love
But my mind holds the key

I’m standing on the stage
Of fear and self-doubt
It’s a hollow play
But they’ll clap anyway

I’m living in an age
That calls darkness light
Though my language is dead
Still the shapes fill my head

I’m living in an age
Whose name I don’t know
Though the fear keeps me moving
Still my heart beats so slow

My body is a cage
We take what we’re given
Just because you’ve forgotten
Doesn’t mean you’re forgiven

I’m living in an age
Still turning in the night
But when I get to the doorway
There’s no one in sight

I’m living in an age
Realizing I’m dancing
With the one I love
But my mind holds the key

Still next to me
My mind holds the key
Set my spirit free

terça-feira, agosto 04, 2009

good morning!





(férias finalmente! s. pedro do sul, vila nova de cacela e fundão, é por onde vou estar nas próximas semanas.)

domingo, agosto 02, 2009


"Saturday", Julie Blackmon

sexta-feira, julho 31, 2009

coração

"all we need is love", Damian Hirst




«Não me beijes por engano
não me causes maior dano
do que aquele que causaste
no dia em que aproximaste
os teus lábios do meu peito
e num momento perfeito
de paz e de assombração
tocaste o meu coração»

Sérgio Godinho




(ontem encontrei este coração com borboletas do damian hirst, ainda não o tinha visto inteiro e sem pessoas à frente. é se calhar um bocadinho exagerado, a cor real deve ser mais viva que a da imagem, e chateia-me que ele use borboletas verdadeiras, mas pareceu-me ir bem com os versos do Sérgio Godinho. obrigada! )

quarta-feira, julho 29, 2009

Mor Karbasi


La galana i la mar - Mor Karbasi








(desde que descobri esta voz que não consigo deixar de ouvir, e fiquei ainda com mais pena de este ano não ter ido a sines.)

merce

segunda-feira, julho 27, 2009

as aulas de inglês no departamento de física

Um dia um colega de faculdade atirou “querem ter aulas de inglês no departamento de física?” eu e a Paula em coro “no departamento de física?”, “de graça”, disse ele. Fomos. Depois da última aula da manhã lá íamos nós a correr para o departamento de física, subíamos três lances de escadas e avançávamos por um longo corredor onde porta sim, porta não, havia um símbolo do nuclear. As aulas alternavam entre a conversação, exercícios de gramática e a repetição de frases tipo “milk, butter and cheese are delivered here from the dairy farms”, o que chegava a ser hilariante! Quase todos os alunos tinham muitas dificuldades com o idioma que precisavam saber para ler os manuais. Lembro-me de uma mulher mais velha, não sei se era aluna ou professora de uma engenharia qualquer, nós éramos os únicos "extra-terrestres" de direito, que numa aula de conversação revelou ter ido à China sem falar uma única palavra de inglês. Para mim e para a Paula, o nosso outro colega entretanto desistiu, aquilo era mais divertido que didáctico.
Numa dessas aulas em que se conversava fomos parar à literatura. Só eu, a Paula e um outro rapaz, um pouco mais velho do que nós, por quem tive uma “identificação à primeira vista”, e que, por isso, se tornou na principal razão para me manter alguns meses a correr para o departamento de física, é que líamos romances, os outros só manuais técnicos. A atenção acabou, naturalmente, por se centrar em nós, não só porque líamos livros, mas também porque sabíamos inglês suficiente para aguentar uma conversa. Eu tinha acabado de ler “O amor nos tempos da Cólera” do García Marquez, e tinha lido Jorge Amado, Milan Kundera, Lobo Antunes, e outros que agora não me lembro, o que, creio, agradou ao professor perante uma sala onde poucos tinham o gosto pela leitura. No fim da aula o professor, um homem baixo, de barbas, que devia andar nos 50 e tal anos, disse que me ia dar uma coisa. O tal rapaz revelou-nos “é um livro”, sorriu, “ele é escritor”. “Ai, é?”, eu e a Paula surpreendidas. Lá fui com o professor até uma outra sala, num outro andar, e com alguns longos corredores pelo meio, sempre com símbolos do nuclear em algumas portas, onde de uma caixa cheia ele tirou um livro, escreveu uma dedicatória simples, e deu-mo.
Ainda frequentei as aulas durante algum tempo, mesmo depois da Paula ter desistido, não tanto para melhorar o inglês, mas na esperança de falar com o tal rapaz. Quem sabe, talvez surgisse a oportunidade de almoçarmos juntos na cantina, ou combinarmos um café, embora eu, na ocasião, fosse tão tímida que jamais tomaria a iniciativa de propor qualquer uma destas coisas a alguém de quem gostasse. Entretanto, também ele deixou de aparecer. Eu comecei a rarear as idas ao inglês, nunca fui de desistir das coisas à primeira, até que resolvi passar a ir almoçar mais cedo com a Paula, não sem continuar, durante algum tempo, a espreitar para o departamento de física sempre que por lá passava.

sábado, julho 25, 2009

quinta-feira, julho 23, 2009

Edward Weston

terça-feira, julho 21, 2009

pra quê somar se a gente pode dividir

 Vinicius & Toquinho - Como dizia o poeta





Quem já passou por essa vida e não viveu
pode ser mais, mas sabe menos do que eu
Porque a vida só se dá pra quem se deu,
pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu
Quem nunca curtiu uma paixão
nunca vai ter nada, não
Não há mal pior do que a descrença,
mesmo o amor que não compensa
é melhor que a solidão
Abre os teus braços,
meu irmão, deixa cair,
pra que somar se a gente pode dividir
Eu francamente já não quero nem saber
de quem não vai porque tem medo de sofrer
Ai de quem não rasga o coração
esse não vai ter perdão
Quem nunca curtiu uma paixão
nunca vai ter nada, não...



Toquinho / Vinicius de Moraes

segunda-feira, julho 20, 2009

pub*




* a pedido de várias famílias :)

sábado, julho 18, 2009

casca





De tanto cantar
não resta da cigarra
senão a sua casca





Matsuo Bashô




sexta-feira, julho 17, 2009

Edward Hopper