terça-feira, janeiro 31, 2012

pink

 Leon de Smet
Harmony in Pink

sábado, janeiro 28, 2012

ponte



sol
    i dão




estou só
                  só
                  sozinha...




                                       sozinhita...
                                       (ó, coitadita 
                                         da pequenita)






só.




              só.




                                só.


                               (tão só.)




à espera.
à procura.


                                     onde está a outra
                                          margem?
                                          ou melhor, a ponte?




sol i dão...






(5-1-2012)



(sempre joguei às escondidas com a solidão. acompanha-me, não lhe escapo. não gosto, mas habituei-me. por vezes confundo-a com a necessidade do silêncio, do vazio criativo. é diferente. no silêncio não estou só, construo-me e recupero partes perdidas. a solidão destrói. faz-me triste. aparece sem convite, coloca dúvidas onde havia certezas, gera inseguranças, injustiças. não lhe escapo. mas procuro diminuí-la, torná-la ridícula. depois respiro, sinto o bater do coração e sei que está tudo bem... espero que os pensamentos voem para longe, e me deixem em paz. )

sexta-feira, janeiro 27, 2012

orquídea

Mapplethorpe



(...)

quarta-feira, janeiro 25, 2012

carne

‎"Understand that if Natasha whores around - and she does - it doesn't offend Andrei, because he doesn't expect anything better from her. He knows she's sleeping with other men. It doensn't affect him. She's flesh. That kind of vulgarity is not so hard for an intellectual man of his caste to accept. It is not seen as particularly immoral. The immorality comes from marrying into another class. (...)
From Ibsen on, especilly in Strindberg, you see that the mixture of the classes destroys. If an aristocratic woman sleeps with a coachman for some reason, she kills herself. She has to. It´s a lousy mix.


When you study acting you study life - how to live life - and one thing you learn is not to get carried away by somebody who hasn't the mind you have. You can't substitute a good body for a good mind. It won't work. Minds go to minds. Bodies go to bodies.There used to be a better understandin of that. If a man wanted a body, he went out and bought it. Now, he marries it. That's the mistake. If he wanted a mistress, okay. But marriage was in the level of mental and sociological rightness. You can't have a whore bring up your child. You just can't." 


Stella Adler on Ibsen, Strindberg and Chekov (aqui sobre "As Três Irmãs", mas especificamente as personagens Andrei e Natasha).







Abri o livro ao calhas e encontrei logo esta passagem deliciosa, que me fez lembrar a minha professora de português do 11º ano, uma Senhora, cheia de classe e pose, com um tom autoritário de professora "à moda antiga", que tinha sido dona de um colégio privado e terminou a carreira no ensino público, e que tive a sorte de apanhar no último ano em que deu aulas. Como se despedia do ensino desfez-se ligeiramente da pose autoritária, mas a sua presença imponente mantinha toda a gente na "ordem". Deu-se também ao luxo de dar a matéria como lhe apeteceu. Fazia dissertações longas e muito interessantes sobre os autores de quem gostava e aos outros dava pouca importância. Graças a ela fiquei livre de ler o maçador "Eurico, o Presbítero", do Alexandre Herculano, do qual falámos apenas de passagem. Dizia de cor poemas do Fernando Pessoa (dos vários heterónimos), deu uma aula brilhante sobre Almeida Garrett, que ainda lembro, desvendou-nos os mistérios dos sonetos de amor do Camões, falando de sexo com uma elegância incrível.
Um dia, a propósito dos "happy ends" do Júlio Dinis, colocou-nos perante esta tese de que,ao contrário do que acontecia nos romances do Júlio Dinis,  "a mistura de classes pelo casamento não resulta", chegando mesmo a aconselhar as raparigas a não o fazer. A partir daí começou a falar sobre casamentos desiguais, não tanto pela diferença de "classe social" mas pela diferença de pensamento, de interesses comuns mínimos, que podem destruir o quotidiano. Deu-nos ainda o exemplo dela, com muito humor, de como teve de aprender agronomia para conseguir ter assunto com o marido, que provavelmente nunca deve ter lido "As folhas caídas" do Garrett. 
Diizia-se que esta mulher de armas, perante os constantes deslizes matrimoniais do marido, o tinha um dia prendido em casa, amarrado a uma cadeira. Não sei se este episódio é real, se ela o contou mesmo ou se sou eu a misturar histórias, mas a verdade é que sempre que me lembro da Dona A. não consigo deixar de a imaginar a amarrar o marido a uma cadeira para que não fugisse atrás  das amantes provavelmente iletradas, mas todas elas carne.



segunda-feira, janeiro 23, 2012

gestos

Elliott Erwitt





J. Rentes de Carvalho, Tempo Contado




De repente, um gesto. Gestos: quais são os "nossos", os que nos definem? talvez não nos pertençam, e venham de um tempo, de uma memória sempre reconstruida; ou talvez sejam sempre únicos, porque único é sempre o momento em que se repetem. Num ritual os gestos renovam  seu significado pela repetição, parecem os mesmos, mas não o são porque o tempo é outro; o objectivo do gesto ritual é re-criar, trazer ao presente o seu significado. 
(Ao repetir os meus gestos, recrio-me? transporto para o presente o que construí com o tempo?)

Mas, de repente, um gesto conhecido de outro lugar ou pessoa, é feito e eu automaticamente reajo. Depois percebo: esta reacção não cabe aqui, não lhe pertence. Então porque aconteceu? Reflexo, memória, identificação, necessidade? Não delibero os gestos que espontâneamente faço, saem livres, mesmo quando já são parte de um reportório aprendido.

Por outro lado, posso criar gestos novos, pensar neles e repeti-los, observar e imitar - o gesto específico de uma personagem, por exemplo. No entanto, na criação interessa-me mais o contrário, despojar-me dos "meus" gestos rotineiros e deixar que o corpo crie o seu caminho, abrir espaço para que o pensamento e a situação criem uma gestualidade nova, com outra carga emocional (a forma a influenciar o conteúdo e vice versa). 
Divago. 
Na verdade, os gestos revelam-nos sempre, e revelam principalmente o que queremos esconder, porque queremos esconder. 
Estamos nus, embora nem sempre sejamos vistos.



(obrigada pela foto. :-) )

domingo, janeiro 22, 2012

sábado, janeiro 21, 2012

criar relação

Uma das primeiras coisas que aprendi em teatro foi a criar relação. Parecia tão evidente, parecia que estava tudo no texto e que bastava dizê-lo para que as relações entre as personagens surgissem magicamente. 
Nada disso.

É preciso tempo, paciência, entrega ao outro, escuta activa, capacidade de receber, generosidade; é preciso saber que a outra pessoa com quem contracenamos também está no mesmo processo, tão ou mais frágil e insegura como nós. É preciso saber que no processo criativo ficamos todos com os nervos em franja, as emoções à flor da pele, por isso é fácil sermos excessivos, e tão facilmente nos zangamos como nos abraçamos. Ficamos mais vulneráveis às criticas, se hoje nos sentimos “lá em cima” por termos conseguido um bocadinho de verdade, no dia seguinte somos a pior porcaria, por termos recuado no processo, por nos termos protegido e impedido de arriscar.

Há anos atrás fiz uma personagem que vai sempre acompanhar-me: um bebé de dois anos. Na verdade fui escolhida para fazer a personagem pela actriz que ia fazer a mãe. Astúcia do encenador, ele sabia que a actriz “mãe” tinha de ter uma afinidade grande com a actriz “filho”, tinha de haver uma compatibilidade de pele.
Durante muito tempo andei perdida: não conseguia mimetizar um bebé por mais observação que fizesse, por mais que visse imagens e filmes.
A personagem apareceu fruto de um conjunto de coisas, mas muito a partir da relação que os actores “mãe” e “pai” estabeleceram comigo, em particular através dos cheiros. Nunca irei esquecer o cheiro doce do colo da “mãe” (pó de talco e incenso) e o cheiro intenso do suor do “pai”.
Eles pegavam em mim ao colo, cantavam-me canções para adormecer, ensinavam-me músicas, brincavam comigo, embalavam-me num berço, protegiam-me, vigiavam-me. A criança surgiu dessa relação entre os três. A sensação de protecção era intensa e sempre presente. 

Criar relação implica uma capacidade de empatia e entrega profundas e quando se consegue as personagens parecem-nos verdadeiras, mesmo quando uma actriz adulta faz um bebé de dois anos, porque a qualidade da relação é idêntica à da vida.

Estamos sempre a criar relação, desde a relação superficial com o rapaz do café onde vamos todos os dias até às relações mais profundas e familiares.
Mas, tal como acontece no teatro, nem sempre conseguimos manter a empatia, a escuta, a generosidade, a capacidade de entender o outro e de o aceitar como é.

Muitas vezes desistimos a meio, não sabemos bem o que queremos e por isso não investimos; temos medo de arriscar, não escutamos, damo-nos mais importância a nós mesmos do que ao outro, saímos de mansinho, afastamo-nos do que não conhecemos, tudo nos parece um ataque;  não temos paciência para esperar que a relação cresça, se desenvolva; para a nutrir e ver evoluir; para aceitar todas as transformações que o curso da vida traz, inevitavelmente, a todos nós e àqueles que fazem parte dos nossos relacionamentos.

Só que na vida nem sempre podemos corrigir os erros, as nossas acções, mesmo as mais insignificantes, têm uma consequência que pode ser mais ou menos definitiva. 

Criar relação nunca é fácil e por vezes também precisamos desatar os nós de relações que não nos fazem/fizeram bem.
Mas, se queremos mesmo ser pessoas, então temos de nos atirar para a relação sem confiar que “o texto” que a vida nos dá para  interpretar é suficiente. Precisamos “perder” algum tempo nessa entrega e na permanente compreensão, de nós próprios e do outro, porque só assim nos espelhamos na nossa humanidade, reconhecendo que todos andamos a tentar não cair do arame onde, passo a passo, vamos colocando os pés.


quarta-feira, janeiro 18, 2012

duas

Ellen Von Unwerth

segunda-feira, janeiro 16, 2012

Malevich
Red Cavalry

domingo, janeiro 15, 2012

outra vez

“Os homens não choram”, tinha ouvido dizer numa outra vida. Mas ele chorava e chorava e chorava. O que era normal, afinal, tinha acabado de nascer. “Outra vez” pensava ele no seu choro, e foi o último minuto de pré-consciência que teve. Depois, esqueceu-se de tudo. De como tinha sido lá dentro, o quente e suave embalar do corpo que o hospedou, o vazio do mar materno que lhe deu alimento e o fez crescer, a protecção redonda do ventre, o conforto daquele pequeno universo que o envolveu. Até que.
Até que teve de sair. Era inevitável. Expulso do seu pequeno paraíso, tinha de se fazer à vida. “Outra vez” pensou, e em segundos, milhares de outros nascimentos passaram pelo seu pequeno cérebro. Era preciso cortar esse cordão umbilical com o passado. Era preciso esquecer todas as vezes que nasceu, que amou, que matou, que se enfureceu, que se comoveu, que perdoou e foi perdoado, que se arrependeu, que se ajoelhou perante o mistério; todas as pessoas que conheceu, as mãos que apertou, os corpos que amou, os filhos que teve, as pessoas amadas que perdeu para a morte; todos os minutos de silêncio e de exaltação, o êxtase e a angústia; a miséria e a riqueza, o trabalho e o ócio; esquecer o sal do mar, o calor do sol a queimar-lhe a pele, os bosques frescos, o cheiro dos animais, o som da lenha a crepitar, o sabor generoso dos frutos, a doçura do vinho; esquecer a música, a vitalidade da dança, a emoção de se sentir tocado por uma obra de arte, a emoção de construir, ou de ser ele próprio uma obra de arte.
Estava cá fora, a luz entrava-lhe baça pelos olhos ainda cegos, guiava-se pelo cheiro.
O cheiro do sangue, o cheiro da pele, o cheiro do alimento: Mãe.
Sem saber ainda dizer a palavra, sem saber que tantas e tantas vezes seria separado daquele conforto, já sabia que aquele corpo que o alimentava, aqueles braços que o envolviam, eram tudo o que precisava para se sentir outra vez lá dentro, protegido.
Cresceria. Conheceria o Pai, uma outra protecção. Com o tempo, aprenderia o que precisava para sobreviver. Teria prazer e tristezas. Sentiria o abandono. Reconheceria o amor. Travaria batalhas. Em algumas seria o seu próprio inimigo. Conheceria o cheiro da morte. Teria sonhos e desilusões. Seria pai e veria crescer os seus filhos.
“Outra vez” pensou naqueles ínfimos segundos antes de se perder de novo para a vida.
Passaria por tudo outra vez. Até voltar de novo para dentro do corpo de uma mulher.
Para nascer.
Outra vez.




Abrazo Amoroso
Frida Kahlo


quinta-feira, janeiro 12, 2012

dormindo


Sleeping Cupid
Caravaggio (1608)

sábado, janeiro 07, 2012

Not the intense moment

"Not the intense moment
Isolated, with no before and after,
But a lifetime burning in every moment
And not the lifetime of one man only
But of old stones that cannot be deciphered.
There is a time for the evening under starlight,
A time for the evening under lamplight
(The evening with the photograph album)
Love is most nearly itself
When here and now cease to matter.
Old men ought to be explorers
Here or there does not matter
We must be still and still moving
Into another intensity
For a further union, a deeper communion
Through the dark cold and the empty desolation,
The wave cry, the wind cry, the vast waters
Of the petrel and the porpoise. In my end is my beginning."


T.S. Eliot







sexta-feira, janeiro 06, 2012

deserto

Edward Weston




(não vale a pena fugir. às vezes a única coisa a fazer é entrar no deserto. percorre-lo, enfrentá-lo, superá-lo. deixar que nos percorra, nos toque, nos desafie, para que no imenso vazio da alma se encontre algum caminho.)

quarta-feira, janeiro 04, 2012

planos

o ano já começou


o plano é não fazer muitos planos


deixar acontecer


aceitar o sol e a chuva


e tudo o que vem


sem dramas


olhar para dentro e para fora com serenidade


ver o que é, com simplicidade e espanto


(perceber os pássaros as gotas de chuva na janela o vento a ondular uma cortina as árvores o mar a montanha o bater do coração o céu nocturno o amanhecer...)


admirar as crianças e os velhos


ter pensamentos generosos e bons para com os outros e para comigo


estar presente


respirar


correr, saltar, dançar, gritar, cantar


sorrir


fazer sorrir


amar


ser






(não planear muito, seguir a rota traçada pela vida; como numa dança, às vezes é preciso saber deixar-nos conduzir para que a nossa coreografia seja ainda mais bela e livre. )