"A família, a escola, os outros, todos elegem em nós uma centelha promissora, um território em que podemos brilhar. Uns nasceram para cantar, outros para dançar, outros nasceram simplesmente para serem outros. Eu nasci para estar calado. Minha única vocação é o silêncio. Foi meu pai que me explicou: tenho inclinação para não falar, um talento para apurar silêncios. Escrevo bem, silêncios, no plural. Sim, porque não há um único silêncio. E todo o silêncio é música em estado de gravidez.
Quando me viam, parado e recatado, no meu invisível recanto, eu não estava pasmado. Estava desempenhado, de alma e corpo ocupados: tecia os delicados fios com que se fabrica a quietude. Eu era um afinador de silêncios."
Mia Couto, Jesusalém
segunda-feira, junho 29, 2009
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
5 comentários:
Já leste? É fixe?
bj
li-o nas duas viagens de ida e volta Coimbra-Lisboa-Coimbra na semana passada :P
gostei de ler, tem passagens muito bonitas.
Eu ainda estou a gerir o estado de graça após a leitura do Leite Derramado, do Chico Buarque.
:)
ando a "namorar" o Leite Derramado há semanas, agora fiquei ainda mais curiosa!
Para mais apetite:
«Com o tempo aprendi que o ciúme é um sentimento para proclamar de peito aberto, no instante mesmo de sua origem. Porque ao nascer, ele é realmente um sentimento cortês, deve ser logo oferecido à mulher como uma rosa. Senão, no instante seguinte ele se fecha em repolho, e dentro dele todo o mal fermenta.»
(Chico Buarque, Leite Derramado)
Enviar um comentário