sexta-feira, junho 08, 2012

excertos

(S., aqui vão os primeiros excertos. podes ler aqui uma entrevista dele.)




"De facto, é possível que alguém se apaixone mais do que uma vez, e algumas pessoas gabam-se - ou queixam-se - de que apaixonar-se e "desapaixonar-se" é algo que lhes acontece (assim como a outras pessoas que vêm a conhecer nesse processo) de modo muito fácil. (...)
Há bases bastante sólidas para se ver o amor, e em particular a condição de "apaixonado", como - quase que por sua própria natureza - uma condição recorrente, passível de repetição, que inclusivamente nos convida a sucessivas tentativas. (...)

 Afinal,a definição romântica do amor como "até que a morte nos separe" está decididamente fora de moda, tendo deixado para trás o seu tempo de vida útil em função da radical alteração das estruturas de parentesco às quais costumava servir e de onde extraia o seu vigor e valorização. Mas o desaparecimento desta noção significa, inevitavelmente, a simplificação dos testes pelos quais uma experiência deve passar para ser chamada de "amor". Não existe um maior número de pessoas a atingir mais vezes os elevados padrões do amor: o que acontece é que esses padrões estão mais baixos. Como resultado, o conjunto de experiências às quais nos referimos através da palavra "amor" expandiu-se muito. Noites avulsas de sexo são descritas por meio da expressão "fazer amor".

A súbita abundância e a evidente disponibilidade das "experiências amorosas" podem alimentar (e de facto alimentam) a convicção de que amar (apaixonar-se, instigar o amor) é uma habilidade que se pode adquirir e que o domínio dessas habilidades aumenta com a prática e a assiduidade do exercício. Pode-se até acreditar (e frequentemente acredita-se) que as habilidades do fazer amor tendem a crescer com a acumulação de experiências; que o próximo amor será uma experiência ainda mais estimulante do que a que estamos a viver actualmente, embora não tão emocionante ou excitante quanto a que virá depois.

Essa é, contudo, outra ilusão... O conhecimento que se amplia juntamente com a série de eventos amorosos é o conhecimento do "amor" como uma série de episódios intensos, curtos e chocantes, desencadeados pela consciência a priori da sua própria fragilidade e curta duração. As habilidades assim adquiridas são as de "terminar rapidamente e começar do início", das quais, segundo Soren Kierkegaard, o Don Giovanni de Mozart era o virtuoso arquetípico.
(...) É tentador afirmar que o efeito desta aparente "aquisição de habilidades" tende a ser, como no caso do Don Giovanni, a desaprendizagem do amor - uma "exercitada incapacidade" de amar."


Zygmunt Bauman
"Amor Líquido"
Relógio d'Água

2 comentários:

Anónimo disse...

obrigada querida,
dá que pensar... é uma análise sociológica do amor, um tanto ao quanto fria! afinal o amor são só experiências e expectativas que criamos?! e onde fica o inexplicável?vou ler a entrevista e tenho de te mandar uns excertos do A eternidade e o desejo...
beijos!

natalie disse...

acho (ainda não li tudo!) que ele critica essa forma fria de ver o amor apenas como um acumular de experiências, mas que ele observa acontecer hoje em dia.

é difícil retirar excertos, acabam por não dar uma ideia correcta... e depois há a forma como os interpretamos! :)
beijos