quinta-feira, março 23, 2017

waiting


“I was waiting for
something extraordinary to
happen
but as the years wasted on
nothing ever did unless I
caused it…”


Charles Bukowski

domingo, março 12, 2017

casas

Oh as casas as casas as casas
Oh as casas as casas as casas
as casas nascem vivem e morrem
Enquanto vivas distinguem-se umas das outras
distinguem-se designadamente pelo cheiro
variam até de sala pra sala
As casas que eu fazia em pequeno
onde estarei eu hoje em pequeno?
Onde estarei aliás eu dos versos daqui a pouco?
Terei eu casa onde reter tudo isto
ou serei sempre somente esta instabilidade?
As casas essas parecem estáveis
mas são tão frágeis as pobres casas
Oh as casas as casas as casas
mudas testemunhas da vida
elas morrem não só ao ser demolidas
Elas morrem com a morte das pessoas
As casas de fora olham-nos pelas janelas
Não sabem nada de casas os construtores
os senhorios os procuradores
Os ricos vivem nos seus palácios
mas a casa dos pobres é todo o mundo
os pobres sim têm o conhecimento das casas
os pobres esses conhecem tudo
Eu amei as casas os recantos das casas
Visitei casas apalpei casas
Só as casas explicam que exista
uma palavra como intimidade
Sem casas não haveria ruas
as ruas onde passamos pelos outros
mas passamos principalmente por nós
Na casa nasci e hei-de morrer
na casa sofri convivi amei
na casa atravessei as estações
Respirei – ó vida simples problema de respiração
Oh as casas as casas as casas


Ruy Belo

sexta-feira, março 10, 2017

cama


Tracey Emin

quinta-feira, março 09, 2017

ternura

(não compreendo quem consegue viver sem ternura.)

domingo, março 05, 2017

sexta-feira, março 03, 2017

...an honourable man

ANTONY
Friends, Romans, countrymen, lend me your ears;
I come to bury Caesar, not to praise him.
The evil that men do lives after them;
The good is oft interred with their bones;
So let it be with Caesar. The noble Brutus
Hath told you Caesar was ambitious:
If it were so, it was a grievous fault,
And grievously hath Caesar answer'd it.
Here, under leave of Brutus and the rest--
For Brutus is an honourable man;
So are they all, all honourable men--
Come I to speak in Caesar's funeral.
He was my friend, faithful and just to me:
But Brutus says he was ambitious;
And Brutus is an honourable man.
He hath brought many captives home to Rome
Whose ransoms did the general coffers fill:
Did this in Caesar seem ambitious?
When that the poor have cried, Caesar hath wept:
Ambition should be made of sterner stuff:
Yet Brutus says he was ambitious;
And Brutus is an honourable man.
You all did see that on the Lupercal
I thrice presented him a kingly crown,
Which he did thrice refuse: was this ambition?
Yet Brutus says he was ambitious;
And, sure, he is an honourable man.
I speak not to disprove what Brutus spoke,
But here I am to speak what I do know.
You all did love him once, not without cause:
What cause withholds you then, to mourn for him?
O judgment! thou art fled to brutish beasts,
And men have lost their reason. Bear with me;
My heart is in the coffin there with Caesar,
And I must pause till it come back to me.


Shakespeare, Julius Caesar

quarta-feira, março 01, 2017

muito longe

III

Não sei falar. Nunca soube. Fico exausta quando
falo. Todos vocês devem ficar a saber disto.
Nunca chego a dizer exactamente aquilo que
pretendo - fica sempre do outro lado do vidro.
Daí a poluição que me envolve. Um pranto.


Derivo das várias posições no mundo. Da
ignorância, de todos os poemas que comi, de
todos os livros, todos os ídolos (geralmente
esquisitos), todos os palcos e cinemas, balcões,
da família, de todos os amigos. Raros no mundo.
Valiosíssimos. Eu sou eles todos e as viagens que
nunca fiz. Sou tudo isso. Não há mais ou menos
importância em nada, especificamente - tudo isto
é o meu sangue no papel.

Tenho várias salivas. Vário géneros. Acumulei
rostos e corpos. E o teu, o teu, o teu, o teu e
ainda o teu, continuam guardados, para sempre,
em todos os meus lugares. Eu sou tudo o que
vocês fizeram de mim. E tu, meu amor, tu dormes
ainda na minha cama. Planetas nos olhos.
Tecendo melodias. Trazendo gengibre na boca.
Para a minha boca. O teu tear.

Importante é dizer-vos que trago fruta para
todos. Flores. Paciência. Coração. Mesa. Uma
lareira. Delícias. Espaço. Muito espaço.
Jacarandás para ti, Mário! Jacarandás para
sempre. Também para ti, todo o Rossio em
Junho. Abraços com força e ombro. Manta.
A minha intenção é dar-vos uma coisa impossível
à partida. Uma invenção.
E estou longe. Estou muito longe para mim.

Passa por aqui, várias vezes por dia, um único
pardal. E nem ele, mais solitário que eu, me
cumprimenta.

Patrícia Baltazar, in Fumar Mata, ed. Madrugadas