sexta-feira, janeiro 30, 2015

alice






chegou a pequena alice
que a vida sempre te maravilhe!

segunda-feira, janeiro 26, 2015

sugestão*


Rene Burri, New Mexico





* ou: my body is a landscape

quinta-feira, janeiro 15, 2015

provavelmente



Provavelmente noutro tempo, noutras circunstâncias
chegaríamos a iguais resultados
pelo que de nada adianta imaginar um almagesto
ou tabelas de paralaxe para isto
a que convencionalmente chamamos amor,
nem calcular o ângulo
entre nós e o centro da terra,
de nada nos aproveitara, tu e eu
centros escorraçados de irregular gravitação.

Porém, isso não me impediu de ver plêiades
cada vez que surgias (só
não te dizia nada) plêiades iluminando
meu Hades
com suas cabrinhas coruscantes
pascendo
o vale da sombra da morte.

E a questão hoje é:
 who’s gonna drive you home tonight?
quando o melancólico transístor
destila também outras perguntas, mas nenhuma
tão dura quanto essa,
por exemplo: porque é que a água tem mais tendência
a subir em tubos estreitos
ao contrário do mercúrio?
Isto é view-master e são coisas que faço
na tua ausência.


Daniel Jonas, Os fantasmas inquilinos, Lisboa: Livros Cotovia, 2005

https://asfolhasardem.wordpress.com





segunda-feira, janeiro 12, 2015

palimpsesto



quando eu nasci a minha avó (paterna) tinha 42 anos, a idade que eu tenho agora.

era uma avó jovem, com os três filhos já adultos, dois deles já casados na ocasião.

depois de eu nascer ela foi e fez tantas coisas, que quando a vejo agora, frágil, enrugada, reconheço o palimpsesto que foi sempre a sua vida, com mudanças e desafios a todo o momento.

lembro-me quando tirou a carta de condução, e como enfrentava o preconceito; lembro-me de a ver sempre activa, sempre a pensar, a antecipar e a resolver problemas.

lembro-me de ir apanhar figos e nozes e maçãs e ameixas e cerejas e azeitonas com ela; de ir apanhar musgo para o presépio, bugalhos e azevinho.

lembro-me das viagens de comboio, de passar na ponte D. Maria Pia, no Porto, e de olharmos lá para baixo e sentirmos tudo a tremer.

lembro-me das noites de sueca, whisky e tabaco; da garrafa de aguardente; da fruteira com maçãs, do galheteiro e dos dentes de alho, dos peixinhos de escabeche, do coelho guisado, da marmelada e do leite creme.

e lembro-me de a ouvir falar de antes, do tempo em que eu ainda não a conhecia, das suas ambições, vontades, sonhos. do que fez, do que não conseguiu fazer, do que nunca sonhou conseguir e fez.

e ao lembrar-me percebo a quantidade de vidas que cabe na vida de uma pessoa, que nada nunca é estático, que nos compete aprender e crescer com as mudanças, mesmo que nem sempre sejam as desejadas.


tenho hoje a idade que a minha avó tinha quando eu nasci.

tantas vidas, desafios, mudanças ainda me esperam.